Categoria: Memória Ilustrada

Confluência de problemas urgentes

O Momento

Título: Confluência de problemas urgentes

Edição 689, de 22 de junho de 1946

Caxias do Sul/RS

Autor: Aristeu

Trecho:

Crianças e Leitura

Em Caxias, como em todos os centros de civilização, há grandes males a sanar. Dentre muitos, um é o da leitura maléficas ou também de livros infantis que, pela ganância monetária, exploram as tendências instintivas da meninice e lhe corrompem a boa índole.

[…]

Haja vista o “Gibi” e o “Guri” e outras similares ao lado de certos opúsculos infantis que subvertem a imaginação da criança mediante o desenho caricaturista e o escrito bravateiro, animalesco e irrealisável.

[…] Pois bem, amigos ledores, compulsae o primeiro número de “Gibi” ou “Guri” que vos cair nas mãos e, oh! contradição, quem anda doutrinando a existência e possibilidade do milagre são precisamente os taes materialistas. Seus contos e apresentação, não já de fadas, são heroismos irrealisaveis de super-homens que, suplantando tudo, milagrosamente, sagraram se afinal heróes vencedores mediante todas as moralidades de arrôjo, de crime, de prestidigitação; feitos irrealisaveie para o comum dos homes.

[..]

Em desta artem vão adquirindo formação completamente negativa, seja no gosto pela arte, seja no conceito da vida, seja no uso de suas faculdades. […]

Há bem pouco tempo, deu-se um episódio que vem testemunhar a veracidade das conclusões aeima.

Um menino de onze anos era assíduo devorador das revistas “Gibi” e “Guri”. Tanto se impregnou daquelas aventuras criminosas que, de gênio bom e delicado, tornou-se autônomo, brigalhão, insuportável. Falecido o pae, insubordinou-se mais e mais contra a mãe. Um dia, afinal, ela o intimou a permanecer em casa para ajuda-la. O valentão, num repente, aventurou praticar uma cena degradante, análoga às lidas nas ditas revistas. Lançou mão do machado e investiu contra a mãe afim de massacrá-la. Isso com onze anos de idade. A cena é verídica e dela pode dar testemunho quem redigiu o presente artigo.

[…]

Apélamos aos paes, aos frofessorado e aos vendedores nos postos e livrarias para que ponham termo à existencia maléfica de tão grave e urgene problema.

Enfoque: Notícia negativa

Crédito: Biblioteca Nacional

Link: https://memoria.bn.br/DocReader/DocReader.aspx?bib=882615&pesq=gibi&pasta=ano%20194&hf=memoria.bn.br&pagfis=3404

1944 – Akinola Lasekan

Akinola Lasekan (1921-1972) nasceu na Nigéria. Foi um artista versátil, foi pintor, ilustrador, designer gráfico e cartunista.

Fez charge para o jornal West African Pilot. Este jornal tinha uma linha editorial nacionalista que combatia o colonialismo da Inglaterra, buscando a independência da Nigéria. O jornal foi lançado em 1937 por Nnamdi Azikwe. Em 1944 começa a publicar o trabalho de Akinola, em um série diária que duraria até 1960.

Créditos imagens: África Cartoons https://africacartoons.com/tag/akinola-lasekan/

1941 – Era uma vez…

“Em 1940, Vicente Guimarães procurou José Neves Queiroz, de uma velha família de gráficos mineiros, com o plano de uma revista infantil. José Queiroz topou a ideia com paixão e, no meio da profusão e do êxito comercial dos gibis, eles saíram com uma revistinha mineiríssima, que o Brasil inteiro leu durante 15 anos.” Ziraldo

Era uma vez… foi a primeira revista infanto-juvenil de Minas Gerais, lançada em 15 de abril de 1940 em Belo Horizonte, . De periodicidade quinzenal, foi rodada na Gráfica Queiroz Breyner.

Tinha uma linha editorial que prestigiava o trabalho de grandes artistas da imprensa mineira e abriu espaço para novos talentos, como Ziraldo. Era uma revista que fazia frente as produções da época que publicavam, principalmente, tradução de material estrangeiro, o que barateava os custos. Objetivava ser uma alternativa ao conteúdo estrangeiro que traziam preocupação na época aos impactos da leitura nos jovens leitores. Diz ser uma revista sadia para mentes sãs.

Inicialmente funcionou sob a direção de Vicente Guimarães, com o subtítulo Revista de Vovô Felício para os seus netinhos. Vicente depois se muda para o Rio de Janeiro para assumir a chefia do departamento do SESI que cuidava do Serviço de Orientação e Recreação da Infância da revista Sesinho (1947). Assim, a condução da revista passou para as mãos dos Estabelecimentos Gráficos Santa Maria, com a direção de José Neves, trocando seu subtítulo para A revista infanto-juvenil mais bonita do Brasil. Essa segunda fase durou até abril de 1955.

Crédito: Edson Nascimento Campos. Texto são em mente sã: um projeto de leitor
Crédito: Blog do jornalista Marcos Massolini: https://almanaquedomalu.blogspot.com/2014/03/bau-do-malu-48-era-uma-vez-n-202.html

Vicente Paulo Guimarães (23/05/1906 – 04/06/1981)

Vicente Guimarães nasceu em Cordisburgo/MG, formou-se como professor primário, trabalhando como Inspetor Federal de Ensino até 1976. Começou sua trajetória publicação narrativas infantis em Caretinha. Depois fundou o Suplemento Infantil de O Diário (1940) de Belo Horizonte. Inspirado com o suplemento, surge a ideia de Era uma vez… Muda-se para o Rio de Janeiro para trabalhar no SESI, criando a revista Sesinho. Volta para BH, atuando em rádio clube e tv. Através do Rotary Club, criou 18 bibliotecas infantis.

José Neves Queiróz

A Gráfica Queiroz Breyner foi, por vários anos, a única gráfica de Belo Horizonte que tinha maquinário apropriado para imprimir as revistas ilustradas da cidade. Imprimia a revista Bello Horizonte (1933) e Alterosa (1939), antes de lançar a Era uma vez…. O gráfico José Neves Queiróz assume a revista infanto-juvenil com a ida de Vicente para o Rio.

Referências

CAMPOS, Edson Nascimento. Era uma vez…, revista de Vovô Felício para os seus netinhos – um projeto de leitura. Vária História, Belo Horizonte, n. 18, set. 1997. p. 273-296. Disponível em: https://static1.squarespace.com/static/561937b1e4b0ae8c3b97a702/t/5727a11040261d0bb594696f/1462214930106/16_Campos%2C+Edson+Nascimento.pdf

CAMPOS, Edson Nascimento. Texto são em mente sã: um projeto de leitor. A prática da leitura na revista Era uma vez…: o Brasil da era Vargas – os anos 40. Belo Horizonte: Faculdade de Letras da UFMG, 2001. Disponível em: http://www.letras.ufmg.br/site/e-livros/Texto%20s%C3%A3o%20em%20mente%20s%C3%A3%20um%20projeto%20de%20leitor.pdf

1939 – Gibi

1ª edição: 12 de abril de 1939 .
Editora O Globo. Formato tabloide com 32 páginas. Custava 300 réis.
Primeira série da revista foi até o número 1739, em 31 de maio de 1950.

.Anúncio do lançamento de Gibi no Jornal O Globo, de 12 de abril de 1939

Adolfo Aizen, jornalista que prestava serviços para Roberto Marinho, visitou os EUA onde conheceu o grande potencial de venda dos suplementos. Aizen voltou com a ideia de implementar essas cadernos no jornal O Globo. Marinho não aprovou por achar que era um investimento de alto risco.

Aizen busca parceiros e encontra a oportunidade de publicar no jornal A Nação. Entre os suplementos, o que mais fez sucesso era o Suplemento Infantil. Logo depois fundaria sua própria editora, Grande Consórcio Suplementos Nacionais, onde passaria a publicar o Suplemento Juvenil.

Vendo o sucesso de vendas de seu antigo colaborador, Roberto Marinho muda de ideia e inicia uma linha de revistas para disputar mercado com Aizen. Para concorrer com o Suplemento Juvenil, lançou O Globo Juvenil. Com o sucesso da primeira revista, em 1939 chega as bancas a revista Gibi.

Gibi era terno que na época significava menino, moleque, menino negro. Muitos desses garotos vendiam jornais nas ruas das grandes cidades. Foi esse pequeno vendedor de jornais negro que inspirou o nome e o personagem apareceu nas capas, ao lado da logo, em diversas edições.

Gibi tinha como conteúdo As Aventuras do Detetive Charlie Chan, Ferdinando, Brucutu, Tarzan, Flash Gordon, Príncipe Valente, Dick Tracy, Spirit, entre outros títulos distribuídos pelo sindicatos norte-americanos detentores dos direitos autorais.

As Aventuras de Chalie Chan, de Earl Derr Biggers, era o destaque do número 1 de Gibi.

Capa da primeira edição de Gibi, de 12 de abril de 1939

O sucesso de vendas e o preço baixo fez com que a revista tivesse três edições por dia e ganhasse uma revista variante, chamada Gibi Mensal.

Em 1952, o Grupo Globo fundou a Rio Gráfica e Editora (RGE), para dar conta do aumento das tiragens das revistas especializadas em quadrinhos. O sucesso durou mais alguns anos, porém o mercado foi se modificando, e os leitores passaram a gostar mais de revistas com uma linha editorial com seus personagens preferidos protagonizando com revistas próprias do que revistas com coletâneas de várias histórias com diferentes personagens e gêneros. Desta maneira, as revistas de coletâneas, que era a característica da Gibi, acabaram sendo descontinuadas. O Novo Gibi, deixou de circular em dezembro de 1954. A Gibi Mensal seguiu até o número 249, em 1961.

Uma tentativa de relançamento aconteceu em 1974 como o Gibi Semanal, que durou 40 números. A segunda, em 1975, lançou o Gibi Especial e teve 8 números. O Almanaque do Gibi Nostalgia, terceira tentativa, durou 6 edições entre 1975 e 1977. Uma coletânea foi criada em 1980, em Gibi de Ouro – Os Clássicos dos Quadrinhos, com 6 edições.

Depois que a RGE se transformou em Editora Globo, 12 edições de Gibi foram lançadas entre 1993 e 1994, com personagens clássicos. Usou-se ainda os títulos Gibizinho entre 1991 e 2006 e o Gibizão da Turma da Mônica, entre 2001 e 2005.

A revista, principalmente em sua primeira fase, fez muito sucesso e deixou sua marca no mercado editorial das hqs. Ao mesmo tempo, uma série de ataques contra os quadrinhos, onde muitos defendiam que eram maléficos para a juventude, jornais rivais d’O Globo passaram a fazer matéria usando Gibi de forma genérica para falar mal sobre todas as revistas de fantasia e aventura e atingir indiretamente Roberto Marinho. Esse cenário permitiu que a marca mudasse o significado de gibi, transformando o termo em sinônimo de histórias em quadrinhos no Brasil.

Lista das edições da revista Gibi:

Gibi/Novo Gibi

  • 1939 a 1950 – Gibi – O Globo – n.  1 ao 1739.
    • 1950 a 1952 – Novo Gibi – O Globo – n. 1740 ao 1797. (Mudança de nome, continuação da numeração).
    • 1952 a 1954 – Novo Gibi – RGE – n. 1798 ao 1842. (O sucesso fez com que o jornal criasse uma editora própria para histórias em quadrinhos: a Rio Gráfica Editora – RGE.) 

Gibi Mensal

Outras revistas Gibis

  • 1944 a 1951 – Gibi de Natal – O Globo – 8 edições,
  • 1965 a 1968 – Gibi Apresenta – RGE – Histórias do Gato Félix, Popeye, Zezé, Gato Maluco e Popeye – 36 edições.
  • 1968 – 1969 – Mini-Gibi – RGE – Formato 5×9 cm – 19 edições.
  • 1974 a 1975 – Gibi Semanal – RGE – 40 edições.
  • 1974 a 1975 – Gibi Coleção – RGE – 4 edições.
  • 1975 a 1977 – Almanaque do Gibi Nostalgia – RGE – 7 edições
  • 1975 – Gibi Especial – RGE – n. 1 ao 5
    • 1975 – Gibi Mensal – RGE – n. 6 ao 8. (Mudança de nome, continuação da numeração).
  • 1985 – Gibi de Ouro – RGE – 6 edições.
  • 1991 a 1998 – Gibizinho da turma da Mônica86 edições.
  • 1993 a 1994 – Gibi – Editora Globo – 12 edições.
  • 1996 a 201 – Gibizão da turma da Mônica – Editora Globo – 9 edições.
  • 1998 a 2003 – Almanaque do Gibizinho Mônica – Editora Globo – 65 edições.

Gibi também inspirou o nome dos espaços dedicados à preservação, organização, leitura, difusão e formação de público leitor de história em quadrinhos. Da junção de gibi + biblioteca , surgiram as gibitecas.

(Explicação mais detalhada sobre a origem da palavra gibi e o contexto que fez com que a marca gibi mudasse de significado. TCC – Do gibi à gibiteca.)

Referências

Acervo O Globo. O Globo. Rio de Janeiro: Editora Globo, 10 de abril de 1939. p. 8. Disponível em https://acervo.oglobo.globo.com/

Acervo O Globo. O Globo. Rio de Janeiro: Editora Globo, 12 de abril de 1939. p. 7. Disponível em https://acervo.oglobo.globo.com/

Guia dos Quadrinhoshttp://www.guiadosquadrinhos.com/

VERGUEIRO, Waldomiro. SANTOS, Roberto E. dos. A revista Gibi e a consolidação do mercado editorial de quadrinhos no Brasil. Matrizes. Vol. 8, n.2, 2014. São Paulo: Universidade de São Paulo, jul./dez de 2014. p. 175-190. Disponível em https://www.redalyc.org/pdf/1430/143032897010.pdf